quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Espaço Alternativo de Performance: “ República do Cochilo” -



Ivoneides Batista Amaral


Em sala de aula falamos muito sobre, cidades, praças e intervenções, a teoria nos  impulsionou a prática e a experiência, que possibilitou um conhecimento real da performance, os riscos e as experimentações; Nos desvendou um outro olhar sobre a cidade, a Praça da República e as pessoas que nos eram anônimas, mas que naquele momento passaram a fazer parte do grupo. Na contramão do fluxo da modernidade, da cidade que não para, instalamos a proposta de compor a “República do Cochilo”, onde as pessoas podiam parar, conversar, se expressar, saindo da contemplação para a participação efetiva. O espectador participador é o agente da experiência.
Mãos a obra, vamos intervir no espaço público aberto a exploração criativa, na praça  desde o momento de montar a República do  Cochilo, muitos transeuntes perguntavam o que ira acontecer aqui? Por quê? Para que? Para quem?  E a resposta era simples é uma intervenção, estamos ocupando a praça e ela de nós pode se ocupar também. Para Bakhtin (2009: 101) a praça pública é um espaço comum, “o lugar onde o povo assume a voz que canta”. A praça é o espaço não segmentado aberto à cotidianidade e ao teatro, mas um teatro sem distinção de atores e espectadores; Um espaço onde são tratadas diversas linguagens, as pessoas se propõe a vários tipos de comunicação, é o lugar na cidade privilegiado para realizar ações participativas.
Foto: Eveline Teixeira
                                                       
Para ocuparmos a praça da república levamos alguns aparatos que nos deram suporte para acontecer à tarde do cochilo sendo, colchonetes, redes, cadeiras e revistas. Que foram distribuídos de forma que as pessoas ficassem a vontade para usar, desde a primeira ação da montagem do espaço já havia a interação com as pessoas que por ali estavam passando, esperando ou simplesmente estavam ali. Para Lygia Clark (1960), “os objetos tem sentido quando manuseados pelos indivíduos”, evidenciando-se como estruturas vivas ou organismos relacionais,  nos posicionamos receptivos ao público.
Entre os vários acontecimentos e ações, tivemos o momento do desabafo, espaço onde as pessoas faziam suas reflexões e idealismos de mudanças, tanto para a sociedade, quanto para sua vida expondo suas expectativas ou “sonhos” a serem realizados e a ação acontecia a “deriva”.

Foto: Eveline Teixeira

O cenário da praça nesse dia tinha outra significação, com objetos que dela não fazem parte no seu cotidiano. Os transeuntes foram muito  receptivos a novidade, usaram não somente os objetos, mas interagiram com o grupo, expondo suas ideias e partilhando os objetos.  Alguns aproveitaram para dormir no aconchego das redes e dos colchonetes. E o grupo “performou” com conversas, acolhidas,  muitos sorrisos que aproximaram os transeuntes e aos que ocupam o espaço da praça como seu. Observações de caráter geral foi apenas um dos muitos elementos que alimentaram as práticas urbana situacionista; deve-se também levar em  consideração sua crítica à cultura de consumo  e suas múltiplas conexões com outras manifestações culturais e políticas.

O termo performance é tão genérico quanto as situações nas quais são utilizadas, na vida e na arte a palavra transita em muitos diálogos. A referência mais comum é a utilização do corpo, como parte construtiva da obra de arte, em formato infindável, baseada em uma ação ao vivo, visto por um público em um lugar e horário determinado e específico.
Ao ocuparmos a praça, praticando uma ação coletiva com a intervenção do público, nos possibilitou a contaminação com o espaço e com as pessoas. A visão e a expectativa que criamos em sala de aula nos estudos teóricos, somente foram possíveis através da prática e do contato com o outro.  A noção de performance como procedimento que se prolonga também no participantes.
Foto: Eveline Teixeira

A tarde no momento de desabafo, pessoas conhecidas e desconhecidas em seu  universo particular, veio nos contagiar com tantas histórias,  noticias e  tantos acontecimentos, cada um diante da sua realidade relatou, seus sonhos,  lutas, dores, desejos de curas, e mudanças de dias melhores. Desse modo se distende a noção de performance como algo aberto e sem limites, resultando num número variável de concepções.
Ao conversar com várias pessoas muitas relataram, problema de saúde e tratamento de câncer. Uma senhora que por ali passava, disse: “ eu gostaria de participar desse momento na praça, mas  minha dor é maior que minhas vontades”.  Assim como está senhora vários transeuntes passaram e fizeram o mesmo desabafo “ tenho dor” de forma dita ou expressiva, e a Doutora Maria Thereza de Azevedo comentou “o mundo esta doente, as pessoas estão doentes.” Complementando a realidade vivida e experiênciada por muitos.
A deriva, partilhando o momento com o outro que passa a fazer parte do grupo, que levou a sério o ato público de partilhar sua vida em um momento de manifestações e conquistas que o país sai às ruas. Para Guy Debord:

 A deriva se apresenta com uma técnica ininterrupta através de diversos ambientes. O conceito de deriva está ligado indissoluvelmente ao reconhecimento de efeitos da natureza psicogeográfica, e à afirmação de um comportamento lúdico-construtivo, o que se opõe em todos os aspectos às noções clássicas de viagem e passeio.( Guy Debord, 1958).

 Para que o ato performático acontecesse, ouve um auxilio mútuo, entre os participantes, foi possível um diálogo informal com os colegas do grupo, uma aproximação antes não experimentada, passamos a conhecer o outro e interagir em grupo, suas ideias e trajetórias da vida cotidiana. Allan Kaprow, fala da necessidade de conversar as experiências de vida, podendo está se tornar materiais para uma ação futura e uma nova arte.  A integração entre o grupo se fez necessária nesta ação coletiva, para que a intervenção acontecesse de fato.

A experiência abordou a questão da intervenção urbana numa perspectiva processual e compartilhada,  além de retomar alguns princípios de ocupação dos espaços urbanos. A extensão da ação como forma de provocar liberdade e atuação de indivíduos que mediante a oportunidade de se expressar, aproveitaram o espaço público de encontro e democrático na praça da república. As pessoas ocupam esse espaço que se forma e se desfaz continuamente.

Bibiografia
BARBOSA, Eduardo Romero Lopes. A Técnica do Détournement no Espaço Urbano: intervenções artísticas de Marcelo Cidade e Gabriel e Tiago Primo.

DEBORD,Guy. Teoria da deriva 1958. Texto publicado no nº. 2 da revista Internacional Situacionista em dezembro de 1958.

JACQUES, Paola Berenstein. Apologia da Deriva: escritos situacionistas sobre a cidade. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2003.

KAPROW, Allan. performance e colaboração: estratégias para abraçar a vida como potência criativa. / Thaise Luciane Nardim. Campinas, SP: [s.n.], 2009.
                             
MARTÍN- Barbero, Jesús. Dos meios as mediações: comunicação, cultura e hegemonia. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2009.

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